Rua dos Araújos


Dona Corina faz carne assada com ouro.

Fingiu desistir da vida, mas ela é a vida.

Djiu-djiu canta para gélidos evangélicos

E suas íris são azuis-olhos-de-humanos.


Vem raiando o Natal, nem só presentes

Fazem a temporada, também desilusões

Como a vizinha despejada, e a distância

Entre fáceis favores e os desfavorecidos.



Lembranças vão chegando, imerecidas

E merecimentos vão sendo esquecidos.

Jogo de escolhas no duelo de intenções

Abre a estação de anseios por algo mais.



Quem desfruta o doce lar no fim da rua

Sabe que nenhum escândalo vai durar.

As faltas e as culpas encontram o álibi,

Pratos limpos esperam sobre a mesa.



A boa vontade supera o efêmero querer

E as certezas tomam o lugar da dúvida.

O que enfeita o templo é luz do passado

E não o brilho provisório do pisca-pisca.



Até quando esconderás de mim o rosto?

Ao cair da tarde, visitas pedem bênção.

O arco da varanda convida àquele reino

De sofás cobertos, tronos de esperança.



No íntimo espaço de recato e obséquio

Nem santos, nem cruzes cheias de dor,

Mas a fé pura da infância que protege

E uma paisagem plácida que descansa.



As portas acessam oceanos guardados

Onde nadam sonhos novos e vencidos.

Desejos que podem separar os parentes,

Mas que se atrasam em respeito à união.



Relatos de lutas ardentes e já distantes

Unem a saudade à vinda de herdeiros.

Tudo é comemoração pela fraternidade

E os corações soam juntos como sinos.



O combate do século ocorreu na cozinha

Entre uma miniatura pinscher e um rato.

Mark e o roedor grunhiram vastos ódios

Como amantes amorosos e amargurados.



Esqueceu a sorte de avisar quem venceu.

O cão veloz, na mesma vila, não lembra -

Corre atrás das almas que descem morro.

O tempo esfria as trapaças rudes do amor.



Os sabores repousam doces na memória,

A visão das paredes descascadas também.

Nunca tive uma família criada às pressas

E que se despediu na fina névoa espiritual.



Todos os dias eu atravessava o véu mágico

E penetrava num mundo encravado na paz:

A cachoeira verde fechava-se atrás de mim

E uma portinhola empenada rangia ao abrir.



Atrás da veneziana, o mini-gigante escoava

Pelas frestas iluminadas do lar de boa gente.

Escrúpulos cínicos e eloqüentes ficam longe

Da galáxia abrigada sob a copa do salgueiro.



Ali, envelhece a luz das estrelas da ternura

Ali, rejuvenesce a gasta e sorridente lição

De que viver é tão simples quando cremos

No verdadeiro amor que nasce da entrega.



Um homem simples que vive de cansaços

Precisa apenas de uma casa antiga de vila,

De um abraço de gente cascuda e grisalha

E do corpo amigo da mulher que o ama.


Isso é um achado. Estou pesquisando o nome do poeta.


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